A melhor criação humana que faz parte do capitalismo é o fim de semana. É nele que podemos exercer nossa liberdade de escolher o que se quer fazer durante o dia, mesmo que esta escolha seja ficar em absoluto silêncio em nossa própria companhia. Passar o domingo lendo ou simplesmente olhando a natureza é algo que deveria ser assegurado a todas as pessoas do planeta.
Infelizmente, depois que criamos os atendimentos 24 horas, nem todas as pessoas tem este privilégio. O que é inacreditável, pensar que muitas pessoas que trabalham para que o comércio e serviços não deixem de funcionar um dia sequer têm seus momentos de lazer abocanhados por seus empregadores. Claro que isto não seria necessário, sacrificar seus momentos com a família por exemplo, se a jornada de trabalho fosse menor e se empregasse um maior número de pessoas. Mas por que as grandes redes de supermercado fariam isto se podem sufocar uma só pessoas com um turno desumano de trabalho?
Conforme o tempo foi passando e fomos aprimorando os serviços e principalmente a tecnologia, o que parece é que as empresas foram ganhando mais e mais espaço sobre nossas vidas. Hoje não há um só dia, inclusive nas manhãs de domingo sem que algum telemarketing ligue em nossos telefones fixos, celulares e até por WhatsApp. É um pesadelo! Não temos mais nem um dia que se possa não pensar neste mundo capitalista. Neste domingo recebi já 5 ligações e atendi duas, uma gravação oferecendo seguro automotivo e outra oferecendo serviços funerários. Não é brincadeira isto! As empresas têm esta decisão de ligar pois não pagam este atendente, é uma gravação. Mas parece que combinam do tema. Lembro-me no início do ano com o número altíssimo de mortes por covid as ligações eram de seguro de vida e serviços funerários. Fiquei na época sem palavras com o tremendo mau gosto oportunista que nossa economia afirmou.
Posso lhe garantir, isto me incomoda muitíssimo! É uma invasão diária em horários inoportunos e pelo visto isto não vai parar por aqui. Começou com um telemarketing ativo em horário comercial, passou pelas publicidades interrompendo vídeos no YouTube e agora os algorítimos que bombardeiam sua time line no facebook e instagram… e as ligações que não param. É invasivo!
O problema que vejo se levantar é uma transformação do capitalismo ainda mais voraz. Não como pensávamos que seria, com humanidade e respeito. Piorou e muito! Hoje todas as pessoas são convidadas a vender alguma coisa, nem que seja suas performances ridículas no TikTok. E acho que nem podemos chamar aquilo de performance. Não podemos ficar sem comprar nem vender algo um só minuto do dia! Um capitalismo neoliberal devorador do bem mais precioso das pessoas, a vida. Não podemos deixar de escolher alguma coisa nem um instante sequer. E também não podemos mais sair dessas redes, pois a vida também se dá por lá. É uma nova estrutura de vida que não sei se eu escolheria viver. Ela está sendo imposta da maneira mais abusiva possível e não estamos percebendo. Não somos mais donos de nossas próprias vidas e isto não tem amais volta.
Basta apenas perguntar: para quem você cedeu sua vida?
Borboletas me convidaram a elas. O privilégio insetal de ser uma borboleta me atraiu. Por certo eu iria ter uma visão diferente dos homens e das coisas. Eu imaginava que o mundo visto de uma borboleta seria, com certeza, um mundo livre aos poemas. Daquele ponto de vista: Vi que as árvores são mais competentes em auroras do que os homens. Vi que as tardes são mais aproveitadas pelas garças do que pelos homens. Vi que as águas têm mais qualidade para a paz do que os homens. Vi que as andorinhas sabem mais das chuvas do que os cientistas. Poderia narrar muitas coisas ainda que pude ver do ponto de vista de uma borboleta. Ali até o meu fascínio era azul.
(Borboletas – Manoel de Barros)
Comentários