“Eu quero viver, não sobreviver”, esta frase foi o título de um trabalho entregue esta semana por um aluno do 1º ano do ensino médio na disciplina projeto de vida. Confesso que ao ler este título fiquei profundamente emocionada por tudo o que isto representa e, ainda mais, pela clara noção de realidade que este adolescente tem do mundo e de sua própria vida.
Sempre que inicia o ano letivo várias questões me orbitam. Questões sobre aprendizado, sobre papel da educação, papel do professor, se eu como professora cumpro aquilo que realmente tenho que cumprir, se chego a cada um de meus alunos de maneira amorosa, acolhedora, dialogada. Questiono-me diariamente se sou mesmo uma professora dentro de tudo que este título carrega. Junto disso tudo busco novas maneiras para abrir e manter um espaço de diálogo. Agora que voltamos definitivamente aos encontros presenciais na sala de aula percebo que temos um complicador no convívio escolar, na relação professor alunas e alunos: a falta de capacidade de uma interação de qualidade daqueles que passaram quase dois anos sem uma rotina de estudo, sem a prática da disciplina do estudar. Hoje temos estudantes totalmente imaturos e que não conseguem silenciar para ouvir a aula, dar oportunidade aos colegas para falar e ouvir. Aqueles que passaram das aulas presenciais para uma modalidade virtual em 2020 - e que na época eram alunos do 8º ano, por exemplo - estão agora no 1º ano do ensino médio. São adolescentes em sua maioria imaturos para estar no ensino médio. Não conviveram com professores e colegas no dia a dia da prática pedagógica. Voltaram violentos, desconectados do convívio humano diário. Pensando sobre isto tudo e também sobre o quão nociva pode ser uma interação somente dada em espaço virtual, levanto hoje o problema da necessidade do convívio escolar para a formação de um convívio social saudável.
Lembro-me que há poucos anos atrás, antes mesmo da pandemia, o governo atual motivava abertamente que nossos filhos fossem educados em casa. Muita gente apoiou esta barbaridade. Por que barbaridade? Porque fazer esta escolha sem estar preparado, sem ter formação para atuar na área específica e em consequência colocar o próprio filho ou filha submetido a situação que os impeça de ter a educação a qual tem direito é sem dúvida desumano. Agir assim fere muitos direitos dessa criança ou adolescente, por exemplo, privá-lo do conhecimento e principalmente do convívio cordial entre seus pares. Isto é fundamental! Aprendemos com o outro, percebemos regras neste convívio, principalmente alteridade, solidariedade, honestidade, amizade.
O que tenho me perguntado é como fazer que cada um de meus alunos e alunas se respeitem. Como fazer que compreendam que quando eles gritam a aula toda eles prejudicam os amigos e principalmente a si próprios? Você pode estar pensando: ora, você é a autoridade da sala. Faça-os parar! Acontece que não acredito em posturas autoritárias, em mandar e obedecer. É muito importante que cada um perceba que também faz parte do todo, Que ninguém fica de fora no convívio social, mas existe exclusão. Eu prefiro me aproximar dos estudantes e não ter poder sobre eles. Mas como fazer que percebam isto? Algumas pessoas já perceberam, como este aluno que quer viver e não sobreviver. Ele quer ser livre, fazer suas escolhas, ter suas oportunidades, ocupar seu lugar no mundo. Ele e todas as pessoas podem, mas o mundo, que pode ser cruel e injusto, se revela inicialmente solidário na escola, então que seja a melhor escola possível.
Escola é ...
o lugar que se faz amigos.
Não se trata só de prédios, salas, quadros,
Programas, horários, conceitos...
Escola é sobretudo, gente
Gente que trabalha, que estuda
Que alegra, se conhece, se estima.
O Diretor é gente,
O coordenador é gente,
O professor é gente,
O aluno é gente,
Cada funcionário é gente.
E a escola será cada vez melhor
Na medida em que cada um se comporte
Como colega, amigo, irmão.
Nada de “ilha cercada de gente por todos os lados”
Nada de conviver com as pessoas e depois,
Descobrir que não tem amizade a ninguém.
Nada de ser como tijolo que forma a parede, Indiferente, frio, só.
Importante na escola não é só estudar, não é só trabalhar,
É também criar laços de amizade,
É criar ambiente de camaradagem,
É conviver, é se “amarrar nela”!
Ora é lógico...
Numa escola assim vai ser fácil! Estudar, trabalhar, crescer,
Fazer amigos, educar-se, ser feliz.
É por aqui que podemos começar a melhorar o mundo.
(Paulo Freire)
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