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Adagio giocoso

Foto do escritor: Flavia QuintanilhaFlavia Quintanilha

A vida, o mundano, a aprisionava. Sentia-se sem ar toda vez que era obrigada a ir a escola, a cumprimentar os parentes, um simples aceno já era demais para a sua maneira de ser… livre. Corria bosques, pulava muros, escrevia

escrevia

escrevia

escrevia

aprendeu cedo a ser ela mesma e as palavras lhe escancaravam as janelas que precisava romper. Já pela manhã encostava suas havaianinhas no meio-fio e sumia. O mundo era tão pequeno com 5 anos. Resumia-se a uma cidadezinha de três mil habitantes. Conhecia cada beco, cada ruela sabia seu nome. Longe das chinelas tirava a camiseta e daí se misturava aos meninos. Ninguém sabia direito o que ela era exatamente. Ela sabia! Não era exatamente nada. Era ela somente, e assim podia tudo. Passou a vida sem falar. Abria a boca só para cantar, no mato, na rua, na igreja, nas correntezas dos rios, na chuva no campo. Cantava sempre que se via só… o tempo todo tempo via a si só, só … e cantava. Era uma voz tão cristalina e forte. Sumiam nas ondas da praia que passou sua infância. Quando não podia passar pelo dia sozinha deixava seu corpo ali, na casinha do fundo, luz difusa, cantos escuros, onde a tinham como queriam… ela longe. Dentro de si. Esconderijo perfeito para quem não tinha direito de ter o poder sobre o próprio corpo de menina. Caiu tantas vezes. Chorou muitas outras sem que pessoa lhe salvasse. Era a noite que as mãos vinham sem fim … e o medo. Passou a se achar nada. O pouco que era foi ela mesma. Mas nunca com a palavra. Nunca. O acolhimento. Nunca. Era só que tinha que passar por essa vida e a venda lhe caiu dos olhos e passou a ver a dor de todas as pessoas que passavam diante e por e nela. Era de dor feito o mundo. Nenhum campo era o suficiente para correr. Era de dor feita a face. E dor feito o dia. E sorriam e cobravam-lhe o sorriso. Ninguém a via. Nunca. Enfadas horas e finitas mãos. Era o escuro da noite que lhe erguia o pranto …. e a manhã que lhe rompiam poemas.




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