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57.600 minutos em branco

Foto do escritor: Flavia QuintanilhaFlavia Quintanilha

Atualizado: 30 de abr. de 2020

Dia desses estava conversando com uma amiga sobre o quanto não é sofrido, para mim, o tempo em distanciamento social pelo covid-19. Do outro lado da linha escuto uma gargalhada e ela dizendo: você vive em quarentena! Naquele momento ri cúmplice de sua piada, mas aquilo soou por dias em meu corpo. Certamente não sou capaz de negar a verdade daquelas palavras, mas não deixo de também ficar aflita pelo futuro quando falamos de coletivo. Sobretudo no Brasil (e nem preciso explicar isso). Alguns países – como a Alemanha – estão a se preparar nesse momento para o que chamam de “segunda onda” do vírus. E com os olhos arregalados eu penso “segunda onda”? Mas nem controlamos a primeira ainda! Seremos arrastados por esse tsunami.

Diante de toda essa aflição tenho me dedicado ao “agora”. Sim percebi que isso é de extrema dificuldade, mas vi algo muito maior. A incerteza do dia a dia é o que me arrasta entre paus, pedras, galhos, boletos e insatisfação ansiosa pelo amanhã. É indubitável que esse vírus provocou uma nova fase na humanidade, a exigência de aparecer. Que fracassada fase aos que correm e se debatem por um lugar ao sol. Aos analógicos que se esforçam desesperadamente em serem digitais. Digo na coisa como um todo. Lutamos (e uso esse verbo propositadamente) para nos enquadrarmos nesse lugar que nem existe. Um virtual que se esforça em estar próximo de tudo aquilo que não deu certo. Estamos mudando a roupa do monstro que nos causa asco para que ele possa sentar em nossa companhia à mesa. Triste.

Triste mas não sofro!


Minha única pergunta é: por que é tão grande o número de pessoas que não encontraram seu propósito? É fácil ter essa pergunta como a primeira. E olhando para o mesmo lugar de onde a questão surge está a resposta, nítida. Não aceitamos o que somos. Isso pode parecer rude, drástico, estarrecedor. Óbvio.

Não é minha intenção aqui apresentar um longo argumento do porquê isso vem a acontecer. Mas de olhar para coisa que é, que já está, que existe e lançar luz nesse lugar desconfortável. E se vivemos a nos comparar, sugiro que olhem para alguém que realmente encontrou seu propósito e observe. Não para tentar equalizar a própria vida numa eterna desculpa, mas para ver o que essa pessoa faz, como vive e é feliz com o que tem. Tente.

Hoje fiz isso sem querer. Não é segredo que adoro podcast. Um de meus preferidos é o Rádio Companhia, o podcast da Companhia das Letras. E para minha surpresa ouvi meu primeiro audiobook, “Cem dias entre céu e mar" de Amyr Klink. Já conhecia o livro e o autor pessoalmente. Mas entrar novamente nessa aventura e ouvir cada passagem me levou a um lugar iluminado, tranquilo e cheio de esperança. Admito que tenho sofrido com a vida prática e todas as coisas desse mundo em que nunca me adaptei. Não é necessário. A vida é o que temos de autêntica subjetividade. A marca pessoal só pode ser manifestada na própria vida. Não se atribui essa tarefa a ninguém.

Então ao voltar o olhar para o todo silenciosamente pode se perceber a dor e despropósito que se alastra pelo mundo como erva daninha em jardim abandonado. Não mudaremos o mundo! Ele não precisa ser mudado! E além disso, o planeta se vira bem sem as pessoas. A única coisa possível a ser, não mudada, mas revelada é a si mesmo. Quem sabe a dor passe no ato de se aceitar. Por que mudaríamos alguma coisa se mal conhecemos aquilo que queremos mudar? E diante dessa realidade momentaneamente distópica ainda prefiro caminhar com Walter Franco “tudo é uma questão de manter a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo”.

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