top of page

Eu me tornei uma Sofista?

Foto do escritor: Flavia QuintanilhaFlavia Quintanilha

Hoje quero propor a seguinte questão: devemos ou não pagar pelo conhecimento que recebemos? Antes que você me devolva seu categórico sim ou não, permita-me ilustrar a proposição com a seguinte história. Há um ano, em meio a uma grande crise, criei o que tomo hoje como minha principal ação de resistência, o café com as filósofas. Encontros que a princípio eram mensais e que a cada encontro presentava uma filósofa que já teve seu pensamento reconhecido como relevante na história. Como estes encontros eram presenciais, recebia os participantes no Café com Propósito e ali naquele ambiente charmoso podia apresentar as pensadoras. Quantos encontros maravilhosos, quantas amizades iniciadas ali e que floresceram como nem imaginaria. Quantos reencontros, tudo isto foi fortalecendo o projeto e me dando força para pensar que realmente é este também o papel da filósofa, meu papel! Mediar os encontros e apresentar os conceitos para ampliar os debates.

Mas a pandemia veio e me retraí pelo cuidado com as pessoas e pausei os encontros presenciais. Passei muitos dias em mais profunda tristeza por não mais poder realizar o café com as filósofas. Foi quando me veio a ideia de retomar os encontros on-line. Mas eu precisaria registrá-los, para poder compartilhar com outras pessoas e então investi num GSuite. Para quem não sabe, é uma ferramenta paga que possibilitam várias coisas, uma delas gravar as aulas pelo meet. Fora isto, fazer parcerias, criar o site, registrar o nome essas coisas burocráticas, mas que garantem a qualidade do trabalho. Sim é caro ter uma ideia e operacionalizá-la em boa qualidade. Eu acredito na ideia! Eu acredito que é de fundamental importância levar o conhecimento para o máximo de pessoas possíveis.

Bem aqui começa a emoção da história. A filósofa que ficou por apresentar quando começou a pandemia foi Simone de Beauvoir. Quando retomei os encontros apresentei o feminismo decolonial de Françoise Vergès. Fiz isto para ter tempo der reestruturar o formato do Café com as Filósofas. Foi um encontro incrível e tivemos participação de todo canto do Brasil. Isto é mesmo maravilhoso, a possibilidade que a internet nos dá de alcançar o que nunca imaginamos. Então chegou o momento da nossa querida filósofa francesa. E parti a divulgar a live de uma aula aberta sobre o tema, “Mediação de Leitura Filosófica do Livro O Segundo Sexo de Simone de Beauvoir”. Assim que “coloquei o pé” na divulgação recebi manifestação contra e de muito preconceito comigo e sobre o livro e a filósofa principalmente. Mais uma confirmação que estes encontros são necessários para todo e qualquer público.

Esta história toda me fez pensar: devemos ou não pagar pelo conhecimento que recebemos? Bem, quem me conhece sabe o quanto defendo a educação pública. E também sabe o quanto professores e professoras que têm sólida formação estão sem trabalho devido a redução de salas de aula e cortes em disciplinas (como a filosofia, por exemplo) e cortes em pesquisa. Isto realmente se coloca para mim como um grande paradoxo. Muitas pessoas são contra ao ensino público e têm um preconceito sobre aquelas pessoas que estão trabalhando, estudando ou pesquisando nas Universidades. Entretanto estas mesmas pessoas reclamam que os conteúdos sejam entregues gratuitamente em canais como YouTube, etc. Tudo tem um custo. O professor em sala de aula tem um custo e quem paga é sempre quem recebe este conteúdo, ou pelos impostos ou pelas mensalidades em instituições particulares. Hoje consigo apresentar meu curso e sei o quanto todo este conhecimento me custou.

Bem, quanto aos ataques dos haters eu realmente agradeço. Prefiro a manifestação franca de quem não sabe o que está fazendo, pois estas pessoas ainda têm a chance de pensar diferente e se pensarmos em métricas eles estão ajudando a divulgar o trabalho, do que o silêncio amigo daqueles que sabem que é preciso quebrar paradigmas e é preciso que as pessoas possam exercer seus trabalhos livremente, mas não são capazes de incentivar pessoas amigas ou conhecidas.

Passei muito tempo questionando se me tornei uma sofista (no sentido de cobrar minha hora de trabalho) ou não, como se isto também fosse um descrédito. Eu sinceramente espero que possamos ser livres em nos realizar naquilo que amamos. Eu continuo com minhas atividades como pesquisadora e filósofa, mas assumo com alegria este papel de comunicar meu conhecimento livremente em minhas plataformas.

Que este ano tenha sido de grandes reflexões para todas, todos e todes que seguem minha coluna Dedo de Moça e que no próximo ano possamos nos empenhar em mais realizar que cancelar.


Dias iluminados!



20 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


Post: Blog2_Post
bottom of page